Os Contornos Da Universalidade Da Cobertura Dos Sistemas Públicos De Saúde Da Holanda, Da Suécia e Do Brasil No Fornecimento De Medicamentos

Thursday, 2 July 2015: 2:15 PM-3:45 PM
TW1.2.02 (Tower One)
Flavia Lopes, Fundacao Joao Pinheiro, Belo Horizonte, Brazil
O Brasil é um país com desigualdades socioeconômicas muito intensas, sendo considerado o país mais desigual do mundo pelo Banco Mundial ao final da década de 1980. Desde então, o processo de redemocratização ocorrido no Brasil teve como um de seus pilares o reconhecimento dos direitos sociais como direitos de cidadania. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais como objetivos fundamentais da república brasileira, de modo que os esforços voltados ao combate da iniquidade têm ocorrido nas searas política e econômica. Assim, foi alterado de modo contundente o modelo de provisão de bem-estar no Brasil, sobressaindo-se a mudança no campo do direito social à saúde com a criação de um Sistema Único de Saúde – SUS – com diretrizes de universalidade, igualdade e integralidade do atendimento. Contudo, a previsão constitucional de que a saúde é direito de todos e dever do Estado tem ensejado debates acerca da legitimidade de o poder público brasileiro definir limites para a prestação do direito à saúde sob o argumento de viabilidade econômica. No presente artigo questiona-se se uma perspectiva de garantia mais ampla do acesso a medicamentos favorece ou ameaça a universalidade pretendida pelo sistema de saúde brasileiro. Extrai-se dos dados do IBGE que, dentre os cuidados de saúde demandados do SUS, o fornecimento de medicamentos consiste em uma ação essencial para garantir maior equidade no acesso aos cuidados de saúde, pois os gastos das famílias de baixa renda com medicamentos é proporcionalmente maior do que os gastos das famílias de mais alta renda. A despeito da necessidade de reverter esse quadro de iniquidade, o Poder Judiciário brasileiro tem determinado que os governos federal, estaduais e municipais forneçam medicamentos não previstos na lista do SUS, sem considerar o impacto orçamentário de suas decisões, que tendem a apresentar elevados custos per capita concentrados na parcela mais rica da população. Assim, o presente artigo pretende examinar os parâmetros legais de fornecimento de medicamentos no sistema de saúde brasileiro, comparando o peso dado aos critérios técnicos, econômicos e políticos na definição da cobertura da política pública de fornecimento de medicamentos com aqueles adotados nos sistemas públicos de saúde holandês e sueco. Com base em dados da OMS, da OCDE, do IBGE e do IPEA foram analisados cada um dos sistemas nacionais de saúde para comparar a representatividade dos gastos privados com medicamentos no total gasto com a saúde em cada um desses países. Os dados revelaram que o impacto dos gastos per capita com medicamentos no total da renda é maior no Brasil do que na Holanda e na Suécia. Verificou-se que a interferência do Poder Judiciário brasileiro com a imposição de critérios políticos em detrimento de critérios técnicos e orçamentários na definição da alocação de recursos no âmbito da política pública de fornecimento de medicamentos ameaça a racionalidade técnica e de economia de saúde que buscam resguardar a viabilidade orçamentária e a sustentabilidade do sistema, dificultando assim a consolidação de um sistema de saúde universal e equitativo.